terça-feira, 28 de abril de 2015

A vilania da expectativa





Vi na TV... “Pesquisadores de uma universidade em Toronto afirmam: Os casais do tipo ‘alma gêmea’, ‘metades da mesma laranja’, ‘um pro outro’ tem menos chance de dar certo e sofrem mais com a relação! Enquanto isso, na vida real, as relações em complexo dinamismo, com atritos, ajustes, pausas saudáveis, etc. tendem a dar certo!”
E foi assim que inspirei-me a escrever sobre o que já reflito faz um tempão...
Creio que em qualquer tipo de relação, não apenas entre casais, as expectativas criadas quanto à postura, atitudes e anseios “do outro” são marcas perigosas para o destino das partes envolvidas e da própria relação. Os pais, atados à expectativa, se acham capazes de escolher o melhor para os filhos. Esses, por sua vez, acreditam que fariam melhor se trocassem de lugar com os pais. O chefe espera, quase sempre, algo diferente do seu funcionário que, por outro lado, tem a esperança de ter o reconhecimento que considera justo. O vizinho tem a expectativa que você não faça barulho e nunca dê uma festa ou receba visitas... e por aí vai! Cria-se assim uma série de expectativas.
Porém, quando o assunto é entre casais... o caso se agrava!
Quando iniciamos uma relação, a deixamos nascer com a expectativa de amar e ser amado de forma torrencial, de nutrirmos paixão eterna, de estarmos juntos na saúde ou na doença, de dividirmos uma vida inteira, de sermos fiéis até que a morte se encarregue do resto... E assim, corremos um enorme risco de nos frustrarmos.
Nós mulheres, umas mais outras menos, porém todas em alguma proporção, sonhamos com um homem que nos valorize, que compartilhe dos proventos, que nos trate como princesas, mas que “nos conceda o direito” de mostrar que somos fortes e, de certa forma, livres, mesmo estando presas. E os homens, cada qual do seu jeito, criam seus sonhos de mulher que guarde a beleza necessária para alimentar seu tesão e que seja ao mesmo tempo boa mãe e boa conservadora do patrimônio familiar.
Sei que são estigmas sociais estes que compõem minha análise. Reconheço isso. Mas, reconheço também, por experiência vivida, que tais expectativas ainda pairam sobre a constituição das relações, mesmo em tempos modernos e tendo sofrido certas modificações contemporâneas. Até porque, os relatos que chegam a mim, é que inclusive com casais homossexuais as coisas se processam da mesma maneira, cheias de expectativas.
E quando o tema da expectativa é comportamental, não apenas no sentido socioeconômico historicamente determinado, mas etológico mesmo (chamo de comportamento aquilo que é percebido das reações de um animal ao ambiente que o cerca e que são, por sua vez, influenciadas por fatores internos variáveis) a coisa se complica. Criamos uma série de ideias do que seja a relação dos nossos sonhos e nos agarramos aos preceitos, deixando, muitas vezes, as oportunas relações assimétricas escaparem por guardarem a aparência de não-promissoras (baseados na analogia da metade da laranja). E elas escapam por entre os dedos. São desperdiçadas.
Bom, não é minha intenção dizer aqui se acho possível escapar da vilã expectativa. Entretanto, de um tempo pra cá, desde que parei para pensar sobre isso, tenho procurado por um novo modelo de me relacionar. Vislumbro uma relação na qual possa deixar claro o que quero, do que não gosto, quem sou eu, o que não quero, onde posso ceder e do que não abro mão. Para mim, se não for assim, não vale a pena! Antes só, do que mal acompanhada!
Já vivi relações mascaradas com a ingênua fantasia de que podemos nos adequar em moldes forçados, com a infeliz ideia de não frustrar as expectativas do outro. Mas, essas não duram, e comigo não poderia ser diferente, pois mais cedo ou mais tarde o calo há de apertar. Daí só resta a solução de nos livrarmos do incômodo sapato apertado e nos frustramos mais uma vez.
Aí você se pergunta: você já conseguiu seu intento? Óbvio que não hehehehe... só para ilustrar... certa vez disse pro cara que queria um relacionamento leve, sem pressão, com a perspectiva (e não expectativa) de curtirmos a evolução da relação com maturidade, ficando o máximo possível só com a “parte boa”. Resposta: “não sou homem de viver nada pela metade” (uiiii acho que não me fiz entender meeeesmo). De outra feita, propus uma relação bacana, mas no modelo “cada macaco em seu galho”. Resposta: “pra mim é tudo ou nada!” (Como assim tudo? Como assim nada? Escolhi o nada!).
Será que é mesmo tão difícil entender? Desejo um relacionamento sem a expectativa da infinitude, posto que é chama, mas que seja eterno enquanto dure; sem o peso da espada, buscando a paz; sem o pensamento de que sou ‘responsável pelo que cativo’ (não quero ninguém em cativeiros, sou contra a escravidão) e sem a ideia fixa e socialmente apregoada de dividir a vida, ao invés de compartilhá-la. Quero viver e deixar viver. Quero cuidar do jardim para que a borboleta volte, se assim for o seu desejo, e prendê-la jamais.
Termino assim, sem maiores expectativas.



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